Entrevista com os médicos Dr. Paulo Menezes e Dr. Leonardo Cortizo

Pioneiro e inédito, o TromboTalks, acontece no próximo dia 25 de janeiro e terá como foco principal discutir sobre a Trombose Venosa Profunda e, mais especificamente, sobre o tromboembolismo pulmonar. Para saber mais sobre o evento, conversamos com os médicos Dr. Paulo Menezes e Dr. Leonardo Cortizo, membros do corpo clínico do Grupo IVA, que realiza o evento. Confira! 

Sobre Trombose Venosa Profunda e Embolia Pulmonar

TromboTalks – O que é a Trombose Venosa Profunda? E qual a relação entre esta doença e a Embolia Pulmonar? Seria a segunda um agravamento da primeira? 

Dr. Paulo Menezes – A Trombose Venosa Profunda (TVP) nada mais é do que a formação de um trombo ou coágulo em uma das veias do sistema venoso profundo. No nosso sistema venoso, as veias são constituídas pelo sistema venoso superficial, que são as veias próximas da pele, e o sistema venoso profundo, que são as veias que estão abaixo da camada muscular. Então, quando essa trombose acontece em uma dessas veias profundas, a gente chama de TVP, Trombose Venosa Profunda. Em 90% das vezes as tromboses acontecem em uma das veias das pernas, então, é muito mais frequente acontecer nessa área do que em qualquer outro segmento do corpo. Quando esse trombo ou esse coágulo se desloca, ou seja, ele não fica mais restrito à perna, ele ganha circulação, se desloca em direção ao coração e cai na circulação do pulmão, obstruindo uma das artérias do pulmão, causando um quadro chamado de Embolia Pulmonar, que vai desde quadros brandos, pouco sintomáticos, até quadros fatais.

TromboTalks – Podemos considerar a trombose como uma doença silenciosa? Quais são os sinais e sintomas a serem observados e quais os principais fatores de risco? 

Dr. Paulo Menezes – Eu não diria que a trombose é uma doença silenciosa, mas sim uma doença súbita, ou seja, de forma súbita a pessoa apresenta um quadro de dor, sobretudo na região da panturrilha, associada ao edema, um inchaço da perna. A gente tem que pensar em trombose, sobretudo nos pacientes que apresentam quadro dessa forma, associado a algum fator de risco. E são vários os fatores de risco. 

Os principais são pacientes que foram submetidos recentemente a alguma cirurgia de grande porte, sobretudo cirurgias ortopédicas e cirurgias oncológicas; ou pacientes que passaram por algum tipo de imobilização recente, que tiveram alguma fratura, algum trauma, que ficaram acamados; ou pacientes que fazem uso de hormônios, sobretudo anticoncepcionais corporais, terapias de reposição hormonal; e ainda pacientes que têm algum diagnóstico de câncer, pacientes oncológicos têm um risco maior de desenvolver trombose. Também mulheres que estão gestantes ou no período pós-parto, que a gente chama de puerpério; e ainda pacientes que têm uma história prévia de trombose, ele está em um risco maior de ter um segundo episódio; pacientes com histórico familiar de trombose, pacientes idosos – a idade avançada é um fator de risco importante – e os pacientes que apresentam o quadro de trombofilia, que é uma condição, genética ou não, em que o paciente apresenta um risco maior de desenvolver trombose. Então, quando o paciente tem um desses fatores de risco e apresenta uma dor súbita associada a inchaço ou edema, esse paciente tem que ser investigado para um diagnóstico de trombose.

TromboTalks – Existe um grupo mais suscetível a essa doença? Mulheres, idosas?

Dr. Paulo Menezes – Os grupos de pacientes mais susceptíveis para desenvolver trombose são os pacientes idosos, ou seja, idade avançada é um fator de risco. Pacientes acima de 70 anos têm um risco de aproximadamente cinco vezes maior desenvolver trombose nos pacientes na faixa etária de 40 a 50 anos. Outro grupo de risco importante são os pacientes do sexo feminino, pela exposição ao uso de hormônio na fase reprodutiva, hormônios anticoncepcionais ou terapia de reposição hormonal quando entra no climatério, e também as mulheres pelo fato de engravidarem e também estarem no período de pós-parto. Muito importante também como um grupo de pacientes de risco, são os pacientes oncológicos.

TromboTalks – Como é feito o tratamento da Trombose Venosa Profunda? Quais casos são cirúrgicos?

Dr. Paulo Menezes – O tratamento é feito através de medicações anticoagulantes, que são medicações que, de uma forma bem básica para explicar, elas afinam o sangue do paciente e impedem o aumento do trombo, impede a propagação da trombose. Então, na imensa maioria das vezes, mais de 90% delas, eu diria, o tratamento é clínico, somente com medicações para dor e uso dos anticoagulantes.

Em pacientes que apresentam tromboses muito extensas, com repercussão, com um edema importante que está afetando o paciente de andar, com um inchaço muito grande, esses pacientes podem ser beneficiados do tratamento cirúrgico, que hoje em dia é realizado de forma minimamente invasiva, por um procedimento chamado de trombectomia, realizado por meio de um pequeno furo na pele e com dispositivos modernos para fazer a aspiração desse quadro, liberando de forma rápida a obstrução da circulação e melhorando os sintomas do paciente.

Dr. Leonardo Cortizo – O tratamento com anticoagulante visa simplesmente a diminuir a progressão do coágulo, ou seja, evitar que esse coágulo venha a acometer mais veias, e também ele faz com que esse coágulo fique mais estável, reduzindo a possibilidade de migração. Então esse é o objetivo primário da anticoagulação. A anticoagulação não tem como objetivo dissolver o coágulo, e sim reduzir a progressão e reduzir a chance de uma Embolia Pulmonar.


TromboTalks – Pensando na característica de multidisciplinaridade e na temática do TromboTalks, por que é importante falar de Embolia Pulmonar sensibilizando diversos profissionais de saúde? Quais são os principais profissionais envolvidos no tratamento desta doença e de que forma eles se cruzam nessa conduta? 

Dr. Leonardo Cortizo – Nessa primeira edição do TromboTalks, nós vamos fazer um evento voltado exclusivamente para a discussão da Embolia Pulmonar. E a Embolia Pulmonar é uma doença tratada de forma multidisciplinar, porque ela pode se manifestar desde sintomas bem leves, até muito graves. 

Dr. Paulo Menezes – Hoje em dia o tratamento da Embolia Pulmonar precisa ser multidisciplinar. Quando um trombo, um coágulo, chega na circulação do pulmão, isso vai afetar obviamente o sistema respiratório, alterando o padrão respiratório do paciente, alterando as taxas, a saturação e isso envolve os cuidados de um pneumologista. A obstrução da circulação do pulmão, pelo fato de a circulação do pulmão e o coração estarem interligados, pode levar a uma sobrecarga do coração, levando à falência do ventrículo direito. Por isso, é extremamente importante ter um cardiologista também no caso. A maioria dos pacientes com Embolia Pulmonar necessita ir para um ambiente de UTI, de terapia intensiva, envolvendo, portanto, os cuidados de uma equipe de terapia intensiva. Esses pacientes precisam fazer exames complexos, como o ecocardiograma, envolvendo um ecocardiografista, uma angiotomografia, necessitando de uma avaliação de um radiologista. E em casos específicos, que o paciente vai precisar ser submetido ao acompanhamento de um cirurgião vascular para indicar, a depender do caso, a abordagem cirúrgica, que é realizada de forma minimamente invasiva através de uma trombectomia da artéria pulmonar.


TromboTalks – Você tem observado, ao longo dos últimos anos, um aumento do aparecimento da doença entre seus pacientes? Em caso positivo, a que associa esse crescimento? 

Dr. Paulo Menezes – Sim, temos observado um aumento da incidência de trombose e de embolia pulmonar nos últimos anos. Na epidemia da Covid, alguns anos atrás, houve um aumento exponencial desses casos. Hoje em dia, também com essa busca pela beleza, melhoria da imagem, da questão estética, tem se mostrado cada vez mais frequente o uso de implantes hormonais que contém hormônios, que aumentam o risco de trombose. Por outro lado, os anticoncepcionais orais têm cada vez mais reduzido a dosagem do estrogênio, o que tem reduzido bastante o potencial de causar trombose. Outra questão importante é o envelhecimento, o aumento da expectativa de vida da população que tem deixado os pacientes viverem por mais tempo e, consequentemente, são expostos e aí tem o maior risco de ter um evento tromboembólico.

TromboTalks – Sobre a Embolia Pulmonar, os casos exigem sempre atendimento emergencial ou ela pode ser prevenida de alguma forma? 

Dr. Paulo Menezes – O diagnóstico e o tratamento da Embolia Pulmonar devem ser sempre manejados de forma emergencial. Como é uma doença aguda, o paciente procura emergência, deve ser feito o diagnóstico e instituído o tratamento o mais rápido possível, porque qualquer atraso no diagnóstico pode implicar em aumento da mortalidade. A questão da profilaxia, ou seja, prevenção de casos de Embolia Pulmonar antes que ele aconteça, ela acontece de forma individualizada deve ser individualizado, feito através de uma avaliação de um cirurgião vascular ou de um cardiologista ou de pneumologista. São situações específicas, por exemplo, o paciente vai ser submetido a uma cirurgia de grande porte, uma grande cirurgia ortopédica, então no pós-operatório os pacientes podem lançar mão, os médicos prescrevem medicações anticoagulantes com a dose reduzida, utilização de meias de compressão elástica para poder prevenir a trombose. Outra situação, por exemplo, pacientes mulheres que já tiveram uma trombose prévia, e engravidam, pode ser necessário tomar alguma medicação anticoagulante durante toda a gestação para poder prevenir. Mas, repito, são situações específicas, não é a regra. Em outras situações, o paciente não tem como prevenir. Simplesmente o quadro se desenvolve de forma aguda e súbita.

TromboTalks – Trata-se de uma doença com alta letalidade? Tem informações sobre dados e taxas brasileiros? 

Dr. Paulo Menezes – A Embolia Pulmonar é uma doença que apresenta um espectro muito variável de apresentação clínica, ou seja, alguns pacientes se apresentam praticamente sem nenhum sintoma, com estado geral muito bom, sem alteração de exames, e outros já se apresentam com um estado muito grave, muitas vezes já em parada cardíaca. Então, a letalidade é variável conforme a apresentação. Avaliando os pólos extremos, os pacientes que têm o que a gente chama de Embolia Pulmonar de baixo risco, ou seja, que estão com os exames todos normais, estão com os dados vitais preservados, esses pacientes têm uma mortalidade menor do que 1%. Já os pacientes que chegam com os dados vitais muito alterados, com a pressão baixa, exames alterados, como ecocardiograma, troponina, etc, esses pacientes têm uma mortalidade maior do que 30%, 40%.

Sobre mortalidade no Brasil, os dados de mortalidade sobre Embolia Pulmonar não são confiáveis. Trata-se de uma doença que quando o paciente morre ela é subdiagnosticada,  então, muitas vezes, o paciente é taxado com morte por infarto ou por Dissecção de Aorta e não é feito o diagnóstico de Embolia Pulmonar. Por isso, os dados aqui no Brasil não são confiáveis. Os dados nos Estados Unidos, por exemplo, são muito mais confiáveis e aproximadamente morrem por ano cerca de 100 mil pessoas em decorrência da Embolia Pulmonar.

Sobre o TromboTalks

TromboTalks – Entre tantas possibilidades de doenças cardiovasculares, por que falar sobre trombose nesta primeira edição e, mais especificamente, por que elencar a Embolia Pulmonar como primeiro foco do evento? 

Dr. Leonardo Cortizo – A escolha do tema Embolia Pulmonar para esse primeiro TromboTalks vem muito a partir da mudança nos últimos anos sobre como a abordagem acerca da Embolia Pulmonar grave vem mudando. Tem havido uma evolução enorme no tratamento para fazer a remoção desses coágulos nos casos mais graves, com o surgimento de novos dispositivos, o que vem transformando a realidade do tratamento da Embolia Pulmonar em outros países, sobretudo nos Estados Unidos, que é pioneiro nesse tipo de tratamento. O objetivo com esse evento é, justamente, chamar atenção para esse assunto e trazer para o conhecimento de todas as áreas afins essas inovações e modalidades, além de discutir sobre como isso pode transformar a realidade que temos hoje no Brasil nessa questão.

Dr. Paulo Menezes – O evento também enfatiza a importância dessa doença, que é muito mais frequente do que a gente imagina. A Embolia Pulmonar hoje representa a terceira causa de mortalidade entre as doenças cardiovasculares, ficando atrás apenas do Infarto Agudo do Miocárdio e do AVC, que é o Acidente Vascular Cerebral. 

TromboTalks – Como foi pensada a programação desse primeiro TromboTalks e qual a sua expectativa? 

Dr. Leonardo Cortizo – A programação do TromboTalks foi pensada com muito carinho, baseada muito no que eu já falei dessas novas terapias relacionadas à embolia pulmonar. A gente vai fazer uma manhã inteira de discussão, trazendo desde os aspectos mais básicos da embolia pulmonar, da sua epidemiologia, como isso está distribuído dentro do nosso país e, aos poucos, vamos evoluindo com a participação de todas essas especialidades, cada uma focando no seu tipo de abordagem. O intensivista vai falar como ele cuida disso na UTI, o anestesista vai falar como é a anestesia no tratamento intervencionista, o pneumologista também. Então, a ideia é que se tenha uma discussão bem completa sobre essa doença.

TromboTalks – O evento traz profissionais de fora da Bahia e até de fora do Brasil, certo? De forma breve, pode citar alguns deles e por que são referências em suas áreas?

Dr. Paulo Menezes – Estamos trazendo três convidados nacionais e um convidado internacional muito importantes e que ficamos muito felizes por terem aceitado o nosso convite. De outros estados, traremos o Dr. Thiago Coutas, do Rio de Janeiro, o Dr. Carlos Gama, de São Paulo, e o Dr. Felipe Nasser, também de São Paulo. O convidado internacional é Dr. Ignacio Cigalini da Argentina, que tem grande experiência com o dispositivo FlowTriever, que é, sem dúvida, a última novidade do mundo para tratamento da Embolia Pulmonar. Vale mencionar também que o Dr. Felipe Nasser é um dos maiores nomes da Cirurgia Vascular e da Radiologia Intervencionista no Brasil com ampla experiência nas mais diversas patologias vasculares.


Dr. Leonardo Cortizo – Nós tivemos o cuidado de convidar pessoas expoentes no tema, tanto da Bahia quanto de outras regiões do Brasil e até de fora dele, porque muitos desses dispositivos novos usados no tratamento da Embolia Pulmonar acabam chegando no Brasil um pouco mais devagar do que em outros países. A Argentina, por exemplo, já tem há algum tempo todos esses dispositivos que estão chegando agora no Brasil, então, consequentemente, os médicos de lá já têm uma maior prática na utilização desses materiais. É um evento para trocar experiências, trazendo casos positivos e também as dificuldades que eles enfrentaram, para que consigamos obter também por aqui grandes resultados com esses novos dispositivos. 

TromboTalks – Um dos objetivos do evento é falar sobre novas práticas e inovações em tratamentos. O que poderia adiantar sobre novidades neste campo? 

Dr. Paulo Menezes – Alguns dispositivos lançados pela indústria médica vieram para substituir técnicas antigas do tratamento da Embolia Pulmonar de casos complexos. Antigamente, por exemplo, se fazia o tratamento dos casos graves de Embolia Pulmonar com a cirurgia aberta convencional, um procedimento extremamente mórbido, que envolve anestesia geral, muito tempo de recuperação em UTI. Os novos dispositivos vieram para serem minimamente invasivos e esse é o grande benefício. A gente consegue fazer o tratamento através de pequenos furinhos na virilha do paciente e fazer uma aspiração desses coágulos com o paciente sendo submetido apenas a anestesia local em uma sedação leve. Esse é o grande trunfo. 

TromboTalks – O Grupo IVA tem se tornado referência na promoção de eventos monotemáticos e multidisciplinares em sua área de atuação, posicionando também Salvador e a Bahia nesse sentido. Além do TromboTalks, o grupo pretende realizar outros eventos este ano? Pode citá-los?

Dr. Leonardo Cortizo – O nosso grupo, o Grupo IVA, tem se consolidado pela realização desse modelo de evento multidisciplinar, monotemático, em que se consegue discutir de forma bem aprofundada os temas propostos. Ficamos bem felizes que nossos eventos têm virado referência e bastante satisfeitos também pelo excelente feedback das outras áreas médicas e também dos responsáveis pelo tratamento das doenças vasculares. Além do TromboTalks, que acontece pela primeira vez, já realizamos o AortaTalks, em que a gente discute sobre o tratamento da Aorta, o FístulaTalks, em que falamos sobre o tratamento dos acessos vasculares com nefrologistas e enfermeiros. E temos outros eventos planejados que pretendemos colocar em prática também ao longo do ano de 2025.